Se suspeitar de mim, eu nego.
Se me acusar, eu nego.
Se gravar a conversa, eu nego.
Se filmar escondido, eu nego.
Se arranjar testemunha, eu nego.
Se mostrar minha assinatura, eu nego.
Se me pegar de surpresa, eu nego.
Ainda que não creia, eu nego.
Não adianta vir com fatos,
que eu só nego.
E assim vou sonegando até o final,
afinal, só negar é o que eu tenho feito
Por mais que pareça loucura,
grande é minha convicção
e com pulso e bela postura
bancarei essa minha versão
Vou falar naquele plenário
num discurso tão comovente
pra você, meu nobre otário,
saber como se engana a gente
E diante daquela tribuna
o texto já está ensaiado,
entrarei em todas lacunas
pra de lá não sair condenado
Por maior que seja a evidência,
Há um arranjo que me favorece
E a prova de que tu precisas
Nos autos ela não aparece
É assim que funciona o sistema
Prevalece a lei do mercado
E aquele que, antes, ministro,
Agora é o meu advogado
A Justiça é mesmo cega
Acredita o jovem mancebo
Quem sabe um dia ela enxerga
As brechas do seu enredo
Em oração pela cura da
‘cegueira’ conveniente
Marllon Uaki Furtado