Invasão insólita
Essas abusadas não me
pedem licença. Saem entrando porta adentro,
invadindo meu ser, sem a menor cerimônia.
Quando um dia penso em
chamá-las, elas não vêm. Parece até que fazem de propósito pegar-me de súbito.
Não aceitam convite antecipado, muito menos recomendações de etiqueta.
Às vezes, estou em
algum lugar supostamente inapropriado, e elas me catucam, me provocam, até que
eu reaja a elas, dando-lhes corpo.
Mas, por mais
inconvenientes que sejam, sabe que até aprecio esse seu modo de ser! Afinal, já
me acostumei às suas visitas desavisadas.
E um dia, quando ouso
esperá-las pegar-me supostamente de surpresa, elas percebem minha maldade e
ainda tiram sarro da minha cara, deixando-me ansioso e frustrado por sua falta.
Acho que seu prazer está
exatamente aí, como num coito não permitido, algo inicialmente violador, mas que
se revela capaz de dominar e obter sua tácita aceitação, permeada inclusive
pelo desejo.
E acabo me rendendo a
elas, dando-lhes, ao final, o que querem.
E assim vou levando
minha vida de frequentes abusos, sem que nada se possa fazer contra essas
danadas letras que me inundam.
Em homenagem aos pobres
poetas violentados diariamente.